O prefeito Marcelo Crivella está proibido de realizar novas obras no Rio sem que antes retome e garanta recursos para terminar os 131 projetos que estão paralisados no município. A determinação é do Tribunal de Contas do Município (TCM), que, na tarde desta terça-feira, julgou uma auditoria sobre os projetos interrompidos. Ao todo, os contratos chegam a R$ 6 bilhões sendo que cerca de R$ 4 bilhões já foram pagos. Relatado pelo conselheiro Felipe Puccioni, o documento foi aprovado por unanimidade.
No entendimento da corte, caso esses projetos não sejam retomados, Crivella ficará sujeito a um processo por improbidade administrativa e configura um infração político-administrativa que pode até mesmo servir de base para a análise de um processo de impeachment pela Câmara do Rio, por violar o artigo 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Esse artigo determina a inclusão de novos projetos ao orçamento quando aqueles que já começaram tiverem recursos.
Na avaliação do TCM, caso seja condenado em um processo por improbidade, Crivella estaria sujeito a ter que ressarcir os cofres públicos em até R$ 4 bilhões — valor do que já foi pago até o momento. Felipe Puccioni lembrou que a paralisação dos projetos por si só já acarretam prejuízos ao erário. Quando os contratos são rescindidos por culpa do gestor público, por exemplo, a administração tem que indenizar as empresas.
— O objetivo é evitar a descontinuidade de investimentos na cidade por troca de governos. Estamos lidando com recursos públicos, Se as obras param não atendem a princípios que devem pautar a administração pública: eficiência, efetividade e economicidade — disse o conselheiro.
Procurada, a prefeitura informou, por meio de nota, que realizou um levantamento de todas as obras paralisadas pela gestão anterior, no início desta administração. "A prefeitura demonstrou que todos os empenhos foram cancelados. Tudo foi feito com transparência, amplamente noticiado pela imprensa logo nos primeiros meses de 2017.Até o momento, a secretaria de Urbanismo, Infraestrutura e Habitação apenas retomou obras paralisadas e executou aquelas emergenciais. Não houve licitação de novas obras dentro de uma política de austeridade", diz a nota. Ainda segundo a prefeitura, em março de 2017, quando o orçamento abriu, o próprio prefeito solicitou que o TCM avaliasse as contas públicas para garantir a legalidade.
As razões para interrupção das obras são variadas. Dos 131 projetos, 46 (35%) estão paralisados desde o fim de 2016 e não foram retomados desde então. Na época, prestes a deixar o governo, o então prefeito Eduardo Paes baixou um decreto suspendendo a execução de projetos, como parte do processo de transição do governo. Outros 18 (14%) estão parados por falta de recursos para serem retomados. Em 16 casos (12%), as obras foram interrompidas por problemas de projeto ou nos canteiros.
E o número de projetos paralisados é até maior. Isso porque os auditores se concentraram apenas na análise dos contratos de maior valor de seis secretárias e empresas públicas. Entre os contratos interrompidos estão investimentos em urbanização (Bairro-Maravilha) em regiões como as comunidades da Muzema (Jacarepaguá), Beira-Rio (Recreio dos Bandeirantes) e Restinga/Continental (Campo Grande). A lista inclui ainda serviços de contenção de encostas no Complexo do Alemão, em comunidades do Rio Comprido (Bispo, Pantanal e Sumaré) e na Vila Cruzeiro. Contratos de conservação e reforma de escolas em várias partes da cidade também constam da lista.
No relatório, os auditores analisaram várias consequências provocadas pela paralisação dos serviços. Em Guaratiba, por exemplo, a suspensão dos serviços do Bairro Carioca fez com que parte da pavimentação já implantada se deteriorasse, o que pode gerar mais custos para a obra. E identificaram outros riscos além do prejuízo ao erário.
“A interrupção das obras pode sujeitar a população na área de influência a riscos potenciais: físicos, que podem atentar contra vida, dentre eles o risco de deslizamentos de encostas em localidades com obras paralisadas de contenção e serviços correlatos; e sociais, que prejudiquem a garantia de acessos aos direitos sociais básicos, por exemplo, unidades escolares inconclusas”, escreveram os auditores do Tribunal de Contas.
Na sessão, alguns conselheiros fizeram considerações sobre a situação atual da administração do prefeito Crivella. Não apenas em relação às obras interrompidas mas também por causa de outros problemas na gestão da cidade.
— O que analisamos é de interesse da cidade. A situação não é grave. É gravíssima. É lamentável, por exemplo, que mães precisem recorrer à Justiça para conseguir matricular seus filhos na rede. As vans circulam por ondem querem pela cidade como se não houvesse fiscalização. E de fato não existe. No BRT, o péssimo estado de conservação das pistas do Transoeste é lamentável. Em algumas estações, o usuário enfrenta superlotação sendo tratado como se fosse gado. Eu tenho mais de 30 anos de vida pública e nunca vislumbrei uma situação como essa — disse o conselheiro Ivan Moreira.
Ivan acrescentou que existe uma certa imobilidade na gestão municipal. Que se reflete até mesmo na quantidade de processos que têm sido relatados pelos gabinetes do TCM.
— Praticamente não há processos da atual gestão. Nosso trabalho tem se concentrando em analisar processos de outras gestões e pedido de aposentadorias. Muitos de servidores que decidiram deixar a prefeitura agora por estarem insatisfeitos com a situação — disse Ivan.
O conselheiro José Moraes acrescentou:
— A questão que discutimos é de gestão pública. E responsabilidade é do prefeito. No entanto, longe da realidade dos problemas do dia a dia, vejo entrevistas em que o prefeito sempre afirma como o Rio é maravilhoso — disse Moraes