quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Bolsonaro reedita briga com deputada em sessão sobre violência contra a mulher

Deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) foi até a mesa do plenário para questionar decisão da deputada Maria do Rosário (PT-RS)Os deputados Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS) protagonizaram mais uma confusão na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (14). Durante a reunião da comissão geral no plenário da Casa, que ocorreu para discutir casos de violência contra mulheres e meninas, Bolsonaro foi alvo de críticas e tumultuou a sessão em diversas ocasiões.
A deputada Maria do Rosário, que presidia o debate, não cedeu aos pedidos de Bolsonaro de ter direito à palavra e disse que não se renderia a “atitudes intimidatórias”. A briga entre os parlamentares não é de hoje. No ano passado, o deputado foi condenado a indenizar Maria do Rosário por ter dito que não a estupraria "porque ela não merecia”.  Ele ainda enfrenta no Conselho de Ética da Câmara um processo por quebra de decoro pelo ocorrido.
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Comissão

Em um dos discursos mais polêmicos da manhã, a presidente do coletivo de lésbicas Coturno de Vênus, Cláudia Macedo, provocou tumulto ao afirmar “que nesta Casa há pelo menos um deputado acusado de apologia ao estupro” e defender que o Parlamento o afaste para sinalizar empenho em acabar com este crime. Ela não citou nomes, mas Bolsonaro – um dos primeiros a chegar à sessão e se inscrever para falar – reagiu imediatamente.
O deputado cobrou que ela revelasse quem era o parlamentar que ela estava acusando. Bolsonaro gritava "palhaça” fora dos microfones – que estavam desligados – e a tensão aumentou.
A deputada Maria do Rosário pediu para que a oradora continuasse seu discurso tentando ignorar Bolsonaro que, em sua frente, com dedo em riste, acusava a parlamentar de “defensora de estuprador”. Sem conseguir a palavra, Bolsonaro chegou a levantar o pedestal dos microfones do plenário e provocando a movimentação de seguranças, mas acabou voltando para sua cadeira pouco depois. 
Bolsonaro chegou a levantar o pedestal dos microfones do plenário, provocando a movimentação de seguranças
Marcelo Camargo/Agência Brasil - 14.9.16
Bolsonaro chegou a levantar o pedestal dos microfones do plenário, provocando a movimentação de seguranças
Em outro momento, foi a vez da vice-presidente da OAB-DF exaltar os ânimos da sessão. A debatedora Daniela Teixeira defendeu a condenação de Bolsonaro sob a acusação de apologia ao estupro.
O parlamentar pediu a palavra por ter sido citado pela debatedora, mas novamente não foi atendido pela deputada Maria do Rosário. Segundo ela, os parlamentares inscritos falariam em outro momento do debate.
Bolsonaro dirigiu-se à mesa e protestou, gritando e com o dedo em riste, contra a decisão. Maria do Rosário pediu respeito quando uma mulher preside a mesa da Casa.

Desfesa

Após a conclusão da fala da última convidada para o debate, Bolsonaro falou na tribuna e defendeu-se das acusações.
Referindo-se ao caso de Liana Friedenbach, estuprada e morta em 2003 em Embu (SP), Bolsonaro disse que na ocasião saiu em defesa da vítima.  O deputado ainda criticou a atuação de Maria do Rosário naquela época. Também acusou a deputada de defender o cunhado, que seria estuprador. A parlamentar não quis se manifestar, por estar presidindo a sessão.
Para Bolsonaro, a realização da comissão geral estaria sendo um desserviço a mulheres vítimas de violência. Ele defendeu a castração química do estuprador e criticou a defesa dos direitos humanos dos acusados de estupro.
O parlamentar também criticou a defesa da discussão de gênero nas escolas, afirmando que estimula o sexo precocemente. Para o parlamentar, não existe cultura do estupro, e sim a "cultura da impunidade".

Críticas

A deputada Jô Moraes (PCdoB-MG) afirmou que o projeto de castração química de acusados de estupro (PL 5398/13) não ajuda a coibir ou prevenir o crime. Segundo ela, o projeto ajuda que o criminoso possa sair da cadeia, já que permite ao condenado optar por castração química como remissão da pena.
O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) criticou a tentativa de intimidação à deputada Maria do Rosário e disse que isso não ocorre quando homens estão presidindo a sessão. Ele elogiou a firmeza da deputada na condução dos trabalhos e defendeu uma escola livre para discutir a igualdade de gênero.

Tensão

O clima já estava tenso desde os primeiros momentos da sessão, quando Bolsonaro e seu filho Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) – adversários ideológicos da petista – sentaram frente a frente com a parlamentar, que foi a primeira a discursar. Assim que Maria do Rosário reassumiu a presidência da sessão, Eduardo Bolsonaro deu início às provocações questionando o tempo que oradores teriam para falar.
Maria do Rosário, visivelmente irritada, informou que responderia posteriormente e chamou a primeira oradora a falar. Bolsonaro lembrou que havia previsão de Ordem do Dia às 13h desta quarta-feira e que uma sessão longa poderia prejudicar parlamentares que pretendem participar da segunda reunião da Câmara. A petista respondeu citando o Regimento e o deputado começou a gritar ao ter tido o microfone fechado.
Maria do Rosário não cedeu a palavra ao deputado Jair Bolsonaro e disse que não se renderia a “atitudes intimidatórias”
Alex Ferreira/Câmara dos Deputados - 14.9.16
Maria do Rosário não cedeu a palavra ao deputado Jair Bolsonaro e disse que não se renderia a “atitudes intimidatórias”
A deputada o ignorou, chamando outra convidada a falar na tribuna. Jair Bolsonaro então questionou falas de pessoas que não estavam na lista da sessão. “A senhora não manda aqui não. Segue o regimento”, gritou.
Jair Bolsonaro não conseguiu mudar a sessão, mas conseguiu tumultuar o clima ao ser abordado por um grupo de simpatizantes, principalmente estudantes, que se concentrou no meio do espaço gravando vídeos e tirando fotos ao lado do parlamentar.
Carla Zambelli Salgado, do Movimento Nas Ruas, convidada à tribuna, aumentou a temperatura do debate quando atacou partidos de esquerda no combate à violência contra a mulher e questionou que “espécie de proteção” legendas como PT e PCdoB defendem quando ignoram “um projeto verdadeiro". "Por que não apoiam o projeto de castração química? Só porque foi apresentado por Jair Bolsonaro (PSC-RJ)?”, provocou. “É um projeto que pode acabar efetivamente com a violência contra a mulher e contra a cultura do estupro", disse.
A parlamentar não reagiu e Thiago André Pierobom de Ávila, promotor de Justiça do Ministério Público no Distrito Federal, respondeu: “Nós não promovemos a defesa de direitos humanos através da violação de outros direitos humanos”, disse, sendo aplaudido pelos convidados.

Projetos de lei

Antes da confusão, Maria do Rosário já tinha se manifestado e defendeu mudança na legislação que trata de procedimentos policiais em casos de violência contra mulheres e meninas. Ela fez um apelo para que a Câmara conclua o Projeto de Lei 3.792, em tramitação desde o ano passado.
Durante a comissão geral realizada no plenário da Câmara para discutir a violência contra mulheres e meninas, a deputada destacou que a proposta cria um sistema integral de proteção às vítimas.
“O projeto prevê vários passos para que uma criança seja protegida quando chega a uma instituição. Prevê que a oitiva da criança seja gravada, que tenha o apoio de profissionais da psicologia atentos às necessidades da criança e que seja um depoimento único”, detalhou.
“As memórias vão se confundindo. Outras podem aparecer depois. Se ela for ouvida e gravada uma vez, não passara pela revitimização de tantas oitivas”, disse.
Uma das autoras do pedido para que a sessão fosse realizada nesta quarta-feira, Maria do Rosário lembrou que, em seu primeiro mandato na Câmara, participou da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre violência contra mulheres, adolescentes e crianças que resultou em novas leis que agravaram penas aplicadas nos casos de crimes sexuais.
“Todas as vezes que os senhores escutam no noticiário ou leem nos jornais a expressão 'estupro de vulnerável' ela é fruto do trabalho das mulheres e homens deste Parlamento. Não é mais possível pela lei uma criança e uma mulher serem julgada pela roupa que usa, pela festa a que compareceu”, exemplificou.

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