quarta-feira, 16 de março de 2016

Delcídio cita Lula, Temer, Renan, Cunha e Aécio em delação

O senador Delcídio do Amaral prestou 21 depoimentos entre os dias 11 e 14 de fevereiro. Citou dezenas de nomes. Políticos do governo e da oposição. Também aparecem partidos, empresários, estatais.
O senador faz acusações ao ex-presidente Lula, à presidente Dilma Rousseff, ao vice, Michel Temer, ao senador Aécio Neves. Falou de desvio de dinheiro, irregularidades em contratos e favorecimento de políticos.
Na decisão, o ministro Teori Zavascki afirma que a delação de Delcídio está diretamente ligada à investigação sobre o plano montado para evitar que o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró firmasse um acordo de delação premiada na Lava Jato. Delcídio do Amaral participou da trama, chegou a ser preso por isso, mas, nos depoimentos, disse que outras pessoas estão envolvidas, como a família do pecuarista José Carlos Bumlai e o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. 
De acordo com Delcídio, Lula pediu "expressamente para que ele ajudasse o amigo José Carlos Bumlai porque supostamente ele estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor Cerveró". Delcídio contou que uma primeira remessa de R$ 50 mil foi entregue por ele próprio em mãos ao então advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, após receber a quantia do filho de José Carlos Bumlai, Mauricio Bumlai. As entregas de valores à família de Nestor Cerveró se repetiram. O total recebido pela família de Cerveró, segundo Delcídio, foi de R$ 250 mil.
Delcídio também disse que Bumlai foi a pessoa que ficou responsável, em um primeiro momento, pelas obras do sítio de Atibaia, que o Ministério Público suspeita que seja do ex-presidente Lula. "Contudo, a realização das obras por Bumlai foi abortada por Leo Pinheiro, então presidente da OAS, outro grande amigo do presidente, que pessoalmente, se dispôs a fazer o serviço por conta própria, através da empreiteira."
O senador Delcídio do Amaral também falou que, na época da CPI dos Correios, que investigava o mensalão, foi montada uma operação para comprar o silêncio do publicitário Marcos Valério, que foi pivô do escândalo. Segundo a delação do senador, em fevereiro de 2006, durante um jantar, eles conversaram sobre um pagamento de uma dívida, prometida por Paulo Okamoto, para que Marcos Valério não falasse sobre as questões do mensalão. O valor seria de R$ 220 milhões. Segundo Delcídio, Marcos Valério recebeu dinheiro. Não os R$ 220 milhões que haviam sido prometidos, mas, de todo modo, silenciou sobre o mensalão.
Delcídio disse ainda que Lula "teve participação em todas as decisões relativas às diretorias das grandes empresas estatais, especialmente a Petrobras". Segundo o senador, a indicação de Nestor Cerveró para a área internacional foi discutida com Lula e a bancada do PT de Mato Grosso do Sul, no Palácio do Planalto, em 2003.
Delcídio disse ter "conhecimento das tratativas ilícitas" para retirar os nomes do então presidente Lula e de seu filho, Fabio Luís da Silva, do relatório final da CPMI dos Correios, que ele presidiu. Segundo ele, o acordão, que envolve inclusive partidos da oposição, foi selado na madrugada de 5 de abril de 2006.
Delcídio contou que a CPI do Cachoeira foi instalada com apoio de Lula, que pretendia atingir Marconi Perilo, do PSDB, então governador de Goiás. Mas, no decorrer das investigações, o senador diz que "constatou que o financiamento de campanha de 2010, especialmente do PT, teria sido realizado por meio de caixa 2".
Delcídio disse que a propina de Belo Monte serviu como contribuição decisiva para as campanhas eleitorais de 2010 e 2014 e que o principal agente negociador do consórcio foi o empreiteiro Flávio Barra, da Andrade Gutierrez. De acordo com o senador, a propina girou em torno de R$ 30 milhões, mas acredita que o valor pode ser ainda maior.
O senador disse que a atuação do "triunvirato" formado pelos ex-ministros Erenice Guerra e Silas Rondeau, do governo Lula, e Antonio Palloci, dos governos Lula e Dilma, "foi fundamental para se chegar ao desenho corporativo e empresarial definitivo do projeto Belo Monte". Delcídio disse estimar que as contribuições para campanhas do PT e PMDB, em 2010 e 2014, giraram em torno de R$ 45 milhões.
Delcídio afirmou que Dilma Rousseff teve conhecimento e participação na nomeação de Nestor Cerveró para a BR-Distribuidora em 2008, ao contrário do que ela declarou; que questionado por qual motivo Cerveró foi indicado para a BR-Distribuidora, Delcídio respondeu que acredita que tenha sido um "prêmio de consolação", em especial pela atuação na compra da sonda
Vitoria 10000, alvo de propina, investigada na Lava Jato.
Delcídio disse que o vice-presidente Michel Temer foi o padrinho da indicação de João Henriques para diretoria da BR-Distribuidora, durante o governo FHC. E que Henriques era o "principal operador" de um esquema de aquisição ilícita de etanol de 1997 a 2001.
Delcídio contou que, em 2008 Michel Temer "teve grande influência na substituição de Nestor Cerveró por Jorge Zelada, outro ex-diretor da Petrobras preso na Lava Jato.
Delcídio disse que a compra de equipamentos da Alstom pela Petrobras no governo FHC foi ilícita e rendeu algo próximo de R$ 10 milhões ao antigo PFL baiano.
Delcídio disse que André Esteves, do banco BTG Pactual, incorria com frequência na prática de exercer influência para a alteração, por via de emendas parlamentares, de medidas provisórias. Que André Esteves não era o único a fazê-lo. Mas, segundo Delcídio, André Esteves nunca pediu a ele a apresentação de emenda dessa estirpe, porque tinha outros canais no Congresso, que passavam por Eduardo Cunha, com quem André Esteves tinha relação densa.
Delcídio disse que Eduardo Cunha funcionava como "menino de recados" de Esteves, principalmente quando o assunto era de interesse do banco BTG, um dos maiores mantenedores do Instituto Lula.
Delcídio também falou sobre vários parlamentares.  Disse que parte da bancada do PMDB no Senado - em especial Renan Calheiros, Edson Lobão, Jader Barbalho, Romero Jucá e Valdir Raupp - apoiou a permanência no cargo do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, o primeiro delator da Lava Jato. Esse time, segundo Delcídio, também atuou nas obras como a usina de Jirau e Belo Monte e, sob a influência do ex-presidente José Sarney, monopolizava nomeações no Governo Federal.
Delcídio também falou de senadores do PT, como Gleisi Hoffmann e Humberto Costa, detalhando esquemas montados para financiar campanhas e despesas dele.
Delcídio contou que o então senador Gim Argelo, do PTB, o senador Vital do Rego, do PMDB, e os deputados federais Marco Maia, do PT, e Francischini, do Solidariedade, cobravam "pedágios" para não convocar e evitar maiores investigações sobre os empresários Leo Pinheiro, Julio Camargo e Ricardo Pessôa – todos investigados na Lava Jato. Segundo o senador, a CPMI de 2014 obrigava os três empresários a jantar todas as segundas-feiras em Brasília para negociar o pagamento de propina.
Delcídio falou também do senador Aécio Neves, presidente do PSDB. Disse que teve conhecimento de um grande esquema de corrupção que ocorria em Furnas e que confirma a participação do tucano nesse esquema.
Delcídio disse que em uma conversa com Lula durante uma viagem a Campinas, o então presidente perguntou-lhe quem era Dimas Toledo. "Um companheiro do setor elétrico, muito competente”, respondeu Delcídio. Ao que Lula teria explicado: "Eu assumi e o Janene veio me pedir pelo Dimas, depois veio o Aécio e pediu por ele. Agora o PT, que era contra, está a favor. Pelo jeito ele está roubando muito", teria dito Lula, segundo Delcídio. O senador explicou que Lula falou que ‘pelo jeito ele está roubando muito’, porque seria necessário muito dinheiro para manter três grandes frentes de pagamentos e três partidos importantes.
Perguntado sobre quem teria recebido valores de Furnas, Delcídio disse sabe que Dimas operacionalizava pagamentos e um dos beneficiários dos valores ilícitos sem dúvida foi Aécio Neves.
Delcídio contou que quando presidia a CPI dos Correios e a comissão decidiu quebrar o sigilo do Banco Rural, Aécio Neves era uma das pessoas que ficaram incomodados com essa quebra. Delcídio disse que Aécio Neves enviou emissários para pedir que o prazo para a entrega das informações fosse ampliado. Delcídio afirmou que foi convencido e concordou em dar mais prazo para o banco apresentar os dados. Mas ao receber as respostas, percebeu com surpresa que o tempo fora utilizado para maquiar dados contábeis do Banco Rural. E que eles atingiriam em cheio as pessoas de Aécio Neves e Clésio Andrade, então governador e vice-governador de Minas Gerais.
Delcídio relatou que os deputados sabiam que esses dados estavam maquiados, como Carlos Sampaio (PSDB) e Eduardo Paes, na época do PSDB, hoje prefeito do Rio pelo PMDB. Delcídio contou que uma vez foi a Belo Horizonte tratar desse assunto com Aécio Neves e na volta ouviu do hoje falecido deputado José Janene, do PP, que Aécio Neves era beneficiário de uma fundação sediada em um paraíso fiscal, da qual ele seria dono ou controlador de fato.
Essa fundação seria sediada em Liechtenstein e estaria em nome da mãe ou do próprio Aécio Neves.
A procuradoria-geral da República vai abrir várias frentes de investigação com base nas informações de Delcídio do Amaral. Diante dos depoimentos, investigadores afirmam que o ex-presidente Lula pode se tornar alvo da maior investigação da Lava Jato no Supremo, a que apura se foi montado uma organização criminosa, com ajuda de políticos, na Petrobras. A PGR também vai avaliar se a Presidente Dilma Rousseff poderá ou não ser investigada, assim como o senador Aécio Neves. Delcidio vai cumprir a pena de dois anos e meio em prisão domiciliar e depois terá que prestar mais seis meses de serviços à comunidade. O acordo prevê ainda que ele só poderá ser condenado a, no máximo, 15 anos de prisão, sendo suspensas outras ações. Depois disso, de qualquer forma, só cumpre os dois anos e meio de prisão domiciliar.
Acusados reagem à delação de Delcídio
O Instituto Lula diz que não comenta falatórios. Que quem quiser levantar suspeitas em relação ao ex-presidente Lula que o faça diretamente e apresente provas, ou não merecerá resposta. Procurados pela TV Globo, os advogados do ex-presidente Lula não se manifestaram.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que não tem conhecimento desses episódios e que se ocorreram, foram sem conexão com o governo dele.
O vice-presidente Michel Temer declarou que nunca foi padrinho de João Augusto Henriques. A indicação do nome dele para ocupar cargo na Petrobras foi feita pela bancada do PMDB na Câmara dos Deputados, assim como a de Jorge Zelada, posteriormente.
Os advogados do banqueiro André Esteves afirmaram que a delação do senador Delcídio do Amaral exime Esteves 100% do processo no Supremo porque o senador indica o senhor José Carlos Bumlai como agente financeiro. O próprio Ministério Público não cita mais André como investigado no anexo da delação.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, disse que não iria comentar a citação na delação do senador Delcídio do Amaral. E que não há uma acusação explícita, mas uma citação de forma genérica. Argumentou ainda que mantém diálogo com presidentes de grandes bancos, disse que não tem vergonha disso, considera normal.
O atual prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), negou que tenha sido procurado por Aécio Neves durante a CPI dos Correios para pedir o adiamento da quebra de sigilo bancário ou por qualquer representante do Banco Rural para tratar do assunto. E que desconhece que tenha havido maquiagem em quaisquer dados e que o trabalho de investigação foi acompanhado por técnicos do Tribunal de Contas da União e do Banco Central.
O senador Humberto Costa afirmou que a delação é um apanhado de notícias velhas a partir da colaboração de um outro delator que já mudou seis vezes o teor das denúncias.
O deputado Carlos Sampaio negou qualquer ilegalidade quando foi sub-relator da CPI dos Correios e lembra que foi ele que solicitou o indiciamento por crime eleitoral do então presidente do PSDB nacional, Eduardo Azeredo, e do coordenador da campanha de Azeredo Cláudio Morão.
A defesa do pecuarista José Carlos Bumlai informou que ele sempre negou enfaticamente as acusações. O filho dele, Maurício Bumlai, rejeita as citações feitas em seu nome pelo senador Delcídio do Amaral em sua delação premiada.
A defesa de Edson Ribeiro informou que desconhece a entrega de valores a Bernardo Cerveró e que, se algo foi entregue, Edson não sabia do conteúdo da matéria.
As defesas de Erenice Guerra e João Henriques dizem que eles irão se manifestar no momento oportuno.
Edson Lobão afirmou que a citação a ele é geral e sem detalhamento.
A defesa do ex-ministro Palocci informou que ele jamais participou de qualquer conversação sobre a Usina de Belo Monte e nem estava no poder executivo nessa época. E que o nome citado na delação, "Antonio Carlos Palocci", não é a pessoa do ex-ministro Antonio Palocci.
A senadora Gleisi Hoffmann afirmou que a delação não aponta qualquer ilícito. São ilações apoiadas em matérias que já foram veiculadas pela imprensa.
Vital do Rego disse que nega qualquer relação com o seu nome e que sempre foi imparcial e respeitou os princípios constitucionais.
Fernando Francischini afirmou que convocou o senador Delcídio em CPIs e comissões e o denunciou por corrupção. Os extratos das passagens aéreas provam que ele nunca esteve em Brasília nas noites dos tais jantares. Esta retaliação, segundo ele, não o intimida e nem vai diminuir suas ações firmes contra o PT.
Jader Barbalho afirmou que tem "zero" envolvimento com as denúncias. E que nunca participou de negociação relacionada à Petrobras ou a Paulo Roberto Costa.
O advogado de Marcos Valério disse que não falou com o cliente dele sobre esse assunto e por isso não pode declarar nada.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB, disse que não foi, nem poderia ser procurado para tratar de nenhum dos assuntos relacionados por Mercadante. Disse ainda que o Senado não tomou nenhuma das iniciativas indicadas. Renan Calheiros disse ainda que as citações não são procedentes.
A defesa de Clésio Andrade disse que desconhece o teor da delação e por isso não vai comentar.
A assessoria de Romero Jucá disse que as alegações contra o senador não mostram especificamente qualquer irregularidade. E afirmou que Jucá está à disposição da Justiça.
A assessoria de José Sarney disse que o ex-presidente jamais se envolveu nos assuntos citados.
O senador Valdir Raupp disse que Paulo Roberto Costa na delação dele declarou que não há indicação de Raupp na Petrobras. O senador também afirmou que não tem nenhuma nomeação no setor elétrico no Governo Federal.
As defesas de Leo Pinheiro e Flavio Barra não irão se manifestar. Não conseguimos contato com o ex-ministro Silas Rondeau. João Henriques só vai se manifestar no momento oportuno.
Marco Maio afirmou que a delação quer desgastar o PT e não recebeu qualquer doação de empresa investigada.
Edson Lobão afirmou que a citação é geral e não o incrimina.
O senador Aécio Neves, do PSDB, afirmou que a mãe dele planejou criar uma fundação no exterior, em 2001, com recursos da venda de imóveis e declarou no imposto de renda. Mas que desistiu em 2007. O senador Aécio Neves afirma que o assunto já foi arquivado por duas vezes - pela Justiça Federal e pela procuradoria-geral da República - sem abertura de ação penal. Sobre a acusação de ter recebido dinheiro de propina de Furnas, o senador Aécio Neves afirma que Delcídio repete acusações falsas.
"A lista de Furnas já teve seu autor condenado, por mais de sete anos, cumpriu pena em Minas, ainda é investigado e processado por inúmeros crimes e essa lista de Furnas não é uma lista, mas várias listas de Furnas para todos os gostos, constituída para chantagear determinados agentes políticos, inclusive do PT", disse o senador.
O senador Aécio Neves disse ainda que jamais tratou com Delcídio de nenhum assunto referente à CPI dos correios. Que nunca pediu a ninguém que o fizesse. E que nunca manteve qualquer relação com o Banco Rural.
O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, afirmou que as acusações de Delcídio são mentirosas e fazem parte de um folclore que já foi evocado outras vezes e devidamente desmentido.
A defesa do ex-ministro Silas Rondeau afirmou agora há pouco que os fatos narrados por Delcídio não são verdadeiros. E que na época ele não era mais ministro.
O banco BTG disse que não é e nunca foi mantenedor do Instituto Lula.

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