Manifestações são as mais importantes desde a queda de Ben Ali, em 2011.
Sucedem-se as tentativas de imolação pelo fogo.
Uma semana de manifestações que foram crescendo em violência, com
assaltos a bancos e edifícios públicos, incêndio de esquadras de polícia e
pilhagem de lojas levaram ontem o governo da Tunísia a decretar o recolher
obrigatório em todo o país entre as 20.00 e as 05.00 da manhã, com o objetivo
de controlar a mais grave vaga de agitação social desde que há cinco anos
um mês de protestos levou à queda do presidente Ben Ali.
Contudo, as manifestações prosseguiram ontem na capital, Tunes, e noutras
cidades do país, como Sidi Bouzid e Kasserine. Só em Tunes, foram detidas
19 pessoas. O primeiro-ministro Habib Essid garantiu que a situação
"está controlada", mas admitiu não existir uma "solução milagrosa" para os
problemas do país.
Os protestos iniciaram-se no sábado passado e foram-se tornando
crescentemente violentos desde quarta-feira, quando o governo ter anunciado
a criação de cinco mil empregos na cidade de Kasserine, no centro do país,
onde um jovem universitário no desemprego, Ridha Yahyaoui, morreu
eletrocutado. Yahyaoui subira a um poste telefónico na manifestação de
sábado e ameaçara suicidar-se depois de saber que o seu nome fora excluído
da lista final para um emprego público. Quando se encontrava no topo do
poste, acabou por se emaranhar nos fios e foi vítima de eletrocussão.
Imolação pelo fogo
De imediato, o caso de Yahyaoui foi comparado ao de Mohamed Bouazizi,
o vendedor ambulante que, em finais de 2010, se imolou pelo fogo, após a
polícia municipal da cidade de Ben Aros lhe ter apreendido os produtos e
multado por venda ilegal. A morte de Bouazizi, a 17 de dezembro de 2011,
desencadeou uma vaga de manifestações por toda a Tunísia que forçaram o
autocrata Ben Ali e sua mulher a fugirem do país.
A lembrar o sucedido em 2011, um homem, cujo nome não foi divulgado,
imolou-se pelo fogo na passada quarta-feira na cidade costeira de Sfax.
E verificou-se ontem em Kasserine uma tentativa falhada de imolação.
Os manifestantes contestam a política do governo, considerando demagógico
e irrealista o anúncio de criação de empregos feito na quarta-feira. Além do
desemprego, que afeta principalmente a população jovem recém-formada, a
inflação está a causar a séria deterioração do poder de compra da população
em geral e, designadamente, das camadas mais desfavorecidas e os residentes
em comunidades economicamente deprimidas, como Kasserine.
Uma das frases mais gritadas pelos manifestantes tem sido "Trabalho,
Liberdade, Dignidade", enumerando as expectativas assim como as promessas
feitas com a "Revolução Jasmim", que ditou o fim das quase três décadas de
Ben Ali (1987-2015).
Ameaça islamita
Outro fator de instabilidade, e que tem afetado negativamente a economia do
país, foram os dois ataques terroristas de 2015, reivindicados pelo Estado
Islâmico (EI), e dirigidos a alvos turísticos: o museu de Bardo, em março, que
fez 22 mortos em Tunes, e a estância balnear de Sousse, onde um atacante
isolado fez 38 mortos. Ainda em 2015, o EI reivindica o ataque contra um
autocarro da polícia, causando 12 mortos.
Desde a queda de Ben Ali, a Tunísia - apontada como a única situação de
relativo sucesso no processo das mudanças políticas conhecido como
Primavera Árabe - tem sido palco de várias ações terroristas reivindicadas,
além do EI, pela Al-Qaeda do Magrebe Islâmico.
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